Dissertação de mestrado – “O medicamento proibido”

Concluída a defesa do mestrado na Unicamp, com a orientação de Marko Monteiro, professor no Departamento de Política Científica e Tecnológica da universidade. Participaram da banca o professor doutor Marco Akerman, da Faculdade de Saúde Pública da USP, e Simone Pallone, professora no Labjor (Laboratório de Estudos Avançados em Jornalismo da Unicamp).

A pesquisa, por meio da Teoria Ator-Rede, mapeou o processo de regulamentação do canabidiol, um dos derivados da maconha, no Brasil.  A dissertação está disponível no site da Unicamp ou aqui. Orgulho imenso desse trabalho que, acredito, contribui para uma melhor relação entre instituições e cidadãos, entre ciência e leigos.

Segue o resumo:

 

Resumo: Este trabalho investiga de que modo o canabidiol (CBD), um dos compostos da cannabis sativa, tomou a mídia, a agenda de agências reguladoras e passou a ser reconhecido pelo seu potencial terapêutico no Brasil no espaço de um ano (de março de 2014 a janeiro de 2015). A pesquisa, mais precisamente, elucida como um deriva-do da maconha foi regulamentado sem que a própria maconha fosse objeto de regulamentação. Para isso, a dissertação acompanha o caso de Anny Fischer, que utilizou o CBD para tratar a síndrome CDKL5, uma forma grave de epilepsia. A doença provoca intensas convulsões já nos primeiros dias de vida e compromete inteiramente o desenvolvimento dos doentes. Não há tratamento específico disponível; com o com-posto, entretanto, Anny conseguiu resultados benéficos, segundo a família e laudo emitido pela USP de Ribeirão Preto. Os dados principais foram coletados por meio de entrevistas; além disso, acompanhei a história como repórter da Folha de S.Paulo e os relatos colhidos nesse período fazem parte da análise. A metodologia adotada para analisar o caso foi a Teoria Ator-Rede (TAR), que permitiu visualizar os diálogos e tensões criadas para que a reclassificação do CBD acontecesse. A principal conclusão da análise dos dados é que a reclassificação do canabidiol foi alcançada por meio de diálogos criados e de diálogos silenciados, em um processo de separação em que o CBD virou um composto alheio à maconha. A existência do canabidiol como elemento único gerador do benefício na epilepsia é negada por aqueles que reivindicam o uso da planta; enquanto outros reforçam que o efeito terapêutico da cannabis sativa só será obtido a partir da exploração de seus compostos. Esse antagonismo movimenta mais imediatamente outras questões como a reivindicação por autonomia, noções mais integrativas de saúde, a necessidade de segurança sobre medicamentos e sobre a prática da medicina, e a complexa relação entre instituições e cidadãos. Ainda, mais profundamente, a reclassificação e a separação do CBD da maconha ajuda na problematização de uma bifurcação anterior – aquela entre conhecimento técnico e leigo, entre ciência e sociedade. Os achados perscrutam o papel da medicina, do jornalismo, da justiça e da ciência – bem como dos valores que produzem e legitimam – e levantam questões que podem ajudar na produção de um diálogo mais atento entre instituições e atores.

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